Sociedade conectada tem novas práticas de ensinar e aprender

FOLHA UOL • 17 de outubro de 2019

Muito se falou nas últimas décadas sobre o impacto que as novas tecnologias teriam no ensino, e uma das suposições mais comentadas era a possibilidade de que computadores substituíssem, em um futuro não tão distante, o professor em sala de aula.

Apesar do boom da educação a distância e de outros modelos educacionais que hoje funcionam por conta dos avanços digitais, a verdade é que o docente não perdeu seu papel fundamental no processo de educação das crianças e jovens - na realidade, ele nunca foi tão importante.

Isto porque, no mundo conectado, a responsabilidade do professor aumenta ainda mais. Se a informação e o conhecimento estão por toda parte, como mostrar aos alunos o que realmente importa? Reformulando um pouco essa pergunta, a questão na verdade é: o que esperar de um estudante midiaticamente educado e, claro, de um educador bem formado para preparar esse aluno para lidar com a avalanche de notícias, textos, imagens e dados que o cercam?

Algumas dessas questões apareceram no podcast do Folha na Sala de 1 de outubro, que discutiu o desafio de se falar de “fake news” na escola, contando casos de professores que conseguiram incluir o assunto nas atividades curriculares.

Entre os depoimentos apresentados no podcast, há a fala de uma pesquisadora que chama a atenção para a necessidade de se instituir uma política nacional de educação midiática que estabeleça parâmetros para o ensino e apoio aos educadores para lidarem com o tema.

A boa notícia é que o Brasil tem a vantagem de contar com Base Nacional Comum Curricular (BNCC), um grande um avanço - e também uma ótima oportunidade - em termos de estabelecimento de parâmetros nacionais para o tema.

Como se sabe, no documento, que descreve os objetivos de aprendizagem dos alunos da educação básica, a educação midiática tem grande presença nos conteúdos de língua portuguesa, além de ser apresentada como tema transversal em outras disciplinas.

É preciso reforçar a importância da Base e da inclusão do campo jornalístico midiático porque mesmo nos países onde a discussão da educação midiática está mais adiantada, como é o caso dos Estados Unidos, não há nenhum tipo de diretriz nacional - até agora, apenas três estados incluíram o tema em seus currículos.

Transformar a BNCC em realidade na sala de aula ainda é um grande desafio no Brasil inteiro, uma vez que nosso país é extenso e bastante desigual. Porém, as experiências mundo afora dão pistas de como isso pode acontecer, e o EducaMídia, programa de educação midiática do Instituto Palavra Aberta, debruçou-se sobre estudos, pesquisas, planos e outros materiais para reunir insumos importantes para instituir essa prática na sala de aula. Todos esses materiais apontam no sentido de repensarmos as habilidades de ler, escrever e participar da sociedade digital com mais criticidade e responsabilidade.

Assim, para conduzir o aluno por essa trilha, o educador precisa:

• explorar novas abordagens pedagógicas proporcionadas pelas tecnologias de informação e comunicação, pensando em como incluí-las no dia a dia escolar - ou seja, se o conhecimento também passa pelo ambiente digital, é preciso saber como incluir um meme, por exemplo, em uma aula de análise e interpretação de texto;

• incentivar uma cultura de aprendizagem que estimule a curiosidade e o aprendizado contínuo, fazendo com que sua turma entenda que a relação com o conhecimento e as mídias não é algo estanque, mas que se movimenta, assim como as tecnologias também evoluem;

• facilitar a aprendizagem de maneira significativa, fazendo uso de recursos diversos de mídia, sejam eles analógicos, como jornais e revistas, ou digitais, como celulares e tablets;

• guiar os alunos para práticas éticas, legais e seguras no ambiente digital e fora dele, estimulando experiências engajadoras que levem os estudantes a participar e contribuir para a sociedade de maneira crítica e responsável, respeitando opiniões diversas e evitando práticas como cyberbullying e exposição a boatos e outras práticas típicas da desinformação.


Isso nos leva a finalmente responder a pergunta sobre o que é uma jovem midiaticamente educado. Em termos gerais, esse aluno deve:

• saber analisar de forma crítica os textos de mídia em qualquer formato, dos impressos à internet, diferenciando os gêneros jornalísticos e publicitários (artigo, reportagem, editorial, memes, post patrocinados etc), desconfiando da origem das informações em redes sociais e checando a veracidade dos dados que recebe;

• compreender como usar os mecanismos de busca, curadoria e produção de conhecimento, manuseando essas ferramentas de pesquisa online e offline de modo a construir seu próprio aprendizado de modo autoral e significativo;

• saber acessar um amplo leque de ferramentas digitais e ter flexibilidade para encontrar e adaptar-se a novas ferramentas, que não param de surgir a todo momento: gadgets, aplicativos, jogos e outros;

• aplicar todo esse conhecimento do ambiente informacional e midiático para solucionar problemas, para o exercício da cidadania e para a autoexpressão, de forma ética e responsável.

Em linhas gerais, educação midiática nada mais é do que formar cidadãos para um mundo conectado. As crianças e os jovens precisam entender que ser cidadão hoje implica em respeitar a diversidade dentro e fora da internet, e que essas duas dimensões são inseparáveis. Um aluno midiaticamente educado se torna um cidadão apto a exercer a sua cidadania e liberdade de expressão em todas essas dimensões.

Notícia publicada no site FOLHA UOL, em 17/10/2019, no endereço eletrônico: https://www1.folha.uol.com.br/educacao/2019/10/sociedade-conectada-tem-novas-praticas-de-ensinar-e-aprender.shtml#_=_


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