"O ministro da Educação é uma pessoa do bem, mas gerencialmente incompetente", diz ex-presidente do Inep

GAUCHAZH • 27 de março de 2019

Em entrevista à Rádio Gaúcha, Marcus Vinícius Rodrigues falou sobre os motivos que resultaram em sua demissão

Após ser exonerado da presidência do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP) pelo ministro da Educação, Ricardo Vélez Rodríguez, Marcus Vinícius Rodrigues disse à Rádio Gaúcha que sua saída era "inevitável" após a publicação da portaria que suspendia por dois anos a avaliação de alfabetização de crianças – um dia depois, o Ministério da Educação (MEC) recuou e revogou a decisão.

— Como a repercussão foi muito negativa, tinham que achar um culpado — afirmou.

A decisão pela demissão de Rodrigues ocorreu já na segunda-feira (25), depois de discussão dele com Vélez. O ministro não teria ciência da suspensão da avaliação e não gostou de não ter sido comunicado. O pedido para que a avaliação fosse suspensa, no entanto, partiu de dentro do MEC. Segundo o ex-presidente do Inep, o Ministério da Educação enfrenta problemas de gestão e disputas internas.

— O ministro Ricardo é uma pessoa do bem, que tem boa vontade, mas é gerencialmente incompetente.

Confira, abaixo, a entrevista concedida às jornalistas Andressa Xavier, Carolina Bahia e Rosane de Oliveira:

Andressa Xavier - O senhor foi demitido ontem. O que foi dito para o senhor, qual foi o contexto dessa saída?

Marcus Vinícius Rodrigues - Esse atrito que culminou na minha demissão começou no início do governo, quando o ministro Ricardo tentou me apresentar nomes para compor a diretoria do Inep que não tinham perfil gerencial, e sim um perfil ideológico muito forte, que na minha visão, não é compatível com uma instituição educacional. Então, quando eu rejeitei esses dois nomes, nós começamos a ter um atrito, que culminou nessa portaria.

Segundo ele, esse foi o motivo da demissão, o que não tem nenhum sentido. Havia uma comissão da Secretaria da Alfabetização, juntamente com uma comissão do Inep, estudando essa portaria há aproximadamente três semanas. Quando eu tive acesso a ela, me chamou atenção o fato de não termos a inclusão da medição da alfabetização, e alertei isso para os diretores. Depois disso, pedi para que eles cobrassem do secretário da Alfabetização (Carlos Nadalim) e isso foi feito, ele confirmou que realmente não teria. Com a experiência de gestor que tenho, isso me acendeu uma luz vermelha, e pedi aos diretores que pedissem para o secretário da Alfabetização isso por escrito. Eles não se sentiram à vontade, só que, em termos de hierarquia, têm uma posição bem menor, e então, por bem, eu achei melhor ligar para o secretário Nadalim e pedir um documento sobre isso e ele mandou um ofício que é muito claro e diz que não era para fazer a medição. Dentro das minhas atribuições legais, publiquei a portaria. Como a repercussão foi muito negativa, tinham que achar um culpado.

O que o ministro não sabia era que eu tinha tomado o cuidado de pedir isso por escrito. Depois disso, tivemos uma conversa não muito amigável. Não teve erro na portaria, foi uma instrução do ministério e estpa documentado. Diante disso, a minha saída era inevitável.

Rosane de Oliveira - Sua saída foi mais uma que ocorreu no MEC nesses três meses de governo e a sensação que se tem é que o ministro da Educação é o mais complicado de todos. Houve um anúncio de que todo o problema do MEC era a ideologia, mas as pessoas que estão caindo são as que este governo indicou. O senhor que passou lá por dentro, vê alguma esperança de que se resolva, ou o ministro não tem mesmo o controle de um ministério tão importante como é o da Educação?

O ministro Ricardo é uma pessoa do bem, que tem boa vontade, mas é gerencialmente incompetente. Ele nunca gerenciou nada na vida e vem de universidade pequena, do interior do Paraná. Ele não teve oportunidade de estudar em boas escolas. Além de toda a defiência de sua educação, ainda nenhuma foi em gestão ou educação. Se me perguntam se hà esperança, minha resposta é não.

Se parar para perceber, nesse período não saiu nenhuma notícia ruim do Inep, todas que saíram durante a minha gestão eram positivas. Isso porque o Inep funcionou com diretoria nomeada por mim, todos de minha confiança, sem nenhuma posição ideológica e sem nenhuma posição de incompetência gerencial. O problema não é só o ideológico, posso até ter essa vertente ideológica, mas o problema é que o Inep hoje não sabe gerenciar. O Ricardo não conseguiu aprender o que é um programa, e eu não estou desmerecendo o professor Ricardo. Porque se a senhora me preguntar se eu sei conceber um plano de alfabetização, eu vou dizer para senhora que eu não sei. Eu sei medir, sei estabelecer indicadores, sei trabalhar com resultados, cada um dentro da sua área. Eu penso que um ministério da importância do da Educação, de um governo que eu trabalhei desde julho, com toda a força, de um governo que vejo como sendo a esperança do Brasil, mas que, infelizmente, algumas posições foram ocupadas por pessoas que não têm a menor noção do que é um planejamento, do que é uma reunião de trabalho.

Eu tive vários encontros com o ministro Ricardo, mas sentar em uma mesa de reunião, sentamos uma vez, para discutir a vinda de uma pessoa de Portugal para o Brasil durante cinco minutos. Mas reunião gerencial, com plano de ação, eu nunca tive nenhuma. E entenda, não foi só o Inep que não teve nenhuma reunião gerencial com o ministro, nenhuma das autarquias tiveram. Aí a senhora me pergunta, vai mudar com o ministro Ricardo? Não. Ele é um pensador. Não sei se a senhora já conseguiu ler os livros do ministro Ricardo. Às vezes é até gostoso da gente ficar deitado numa rede, e eu estou usando um tempo cearense, porque sou cearense, mas uma coisa é trabalhar com essa visão e a outra é dirigir a educação do Brasil. Eu espero que o presidente Bolsonaro, que se empenhou e arriscou pra chegar onde chegou, entenda isso. Eu vou continuar trabalhando pelo governo. Vou me ausentar, provavelmente, momentaneamente, até que as coisas se resolvam.

Carolina Bahia - Até que ponto o chamado "guru ideológico" do governo, Olavo de Carvalho, tem peso no que está sendo feito dentro do ministério da Educação? Porque a informação que temos em Brasília é que existe, também, uma disputa de poder entre um grupo ligado ao Olavo de Carvalho e outro grupo, indicado de maneira técnica, como o senhor, ou indicado pela ala militar. Existe isso dentro do ministério da Educação, essa briga por poder e liderada pelo grupo do Olavo de Carvalho?

Não, não. O Olavo de Carvalho realmente tem pessoas do lado, mas não existe essa tendência.

Notícia publicada no site GAUCHAZH, em 27/03/2019, no endereço eletrônico: https://gauchazh.clicrbs.com.br/educacao-e-emprego/noticia/2019/03/o-ministro-da-educacao-e-uma-pessoa-do-bem-mas-gerencialmente-incompetente-diz-ex-presidente-do-inep-cjtr9nxtt00q301ll4s886hb6.html


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