20 anos de Sinaes, na perspectiva de quem faz política pública

REVISTA ENSINO SUPERIOR • 06 de maio de 2024

Fonte da Notícia: REVISTA ENSINO SUPERIOR
Data da Publicação original: 30/04/2024
Publicado Originalmente em: https://revistaensinosuperior.com.br/2024/04/30/20-anos-de-sinaes-politica-publica/

Por Fábio Reis e Lincoln Villas Bôas Macena*: É preciso celebrar os 20 anos do Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior (Sinaes), afinal, a Lei 10.861 de 2004, que o instituiu, foi responsável por organizar o funcionamento do atual sistema de avaliação do Brasil. A essência do que foi previsto no Sinaes precisa ser retomada e se tornar realidade, já que ocorreram mudanças e implementação de indicadores que não correspondem a ela.

No evento Sinaes 20 anos, que aconteceu nos dias 24 e 25 de abril, em Brasília, organizado pelo Inep, o Ministro Camilo Santana destacou a importância do sistema como instrumento que aprimorou a qualidade dos cursos e instituições, de modo integrado, processual e sistêmico, avaliando estudantes, cursos e IES. Segundo o ministro, o Sinaes “permite entender melhor as necessidades e os desafios do nosso sistema educacional e consequentemente trabalhar de forma mais eficaz e promover melhorias”. Santana ainda manifestou a preocupação com a formação de professores nos cursos de licenciatura e com a qualidade do EAD, que precisam, segundo ele, de regulação e avaliação.

Ulysses Teixeira, diretor de avaliação da educação superior, e sua equipe apresentaram as mudanças previstas nos novos instrumentos de avaliação, que vão proporcionar uma cesta de indicadores que possibilitam diferentes olhares, ou seja, empregadores poderão buscar informações do seu interesse, a sociedade poderá buscar indicadores de impacto social, os agentes públicos talvez tenham interesse por um olhar mais holístico, já que são os formuladores das políticas públicas.

Entre as propostas centrais de mudanças no sistema de avaliação, podemos apontar:

– Produção de Indicadores que alcancem a diversidade de instituições de ensino do país;

– Interesse de aumentar a capacidade do Inep em produzir indicadores e informações que auxiliem na reflexão dos caminhos que as instituições devem seguir, entre eles, indicadores de egresso, impacto social, empregabilidade, entre outros;

– Reformulação do ENADE e a decisão que em 2024 a avaliação será exclusivamente para as licenciaturas;

– Atenção para os números docentes frente à quantidade de cursos e de alunos nos cursos da educação superior (em especial no EAD) e os novos desenhos institucionais da modalidade.

Para o Inep é preciso modificar os instrumentos de avaliação já que as Instituições e cursos avaliados possuem conceitos 4 ou 5, revelando que chegamos a um ponto que talvez o conceito máximo não signifique mais alta qualidade.

Nas propostas de mudanças do sistema de avaliação, os indicadores do IGC, CPC, continuam na agenda do MEC. Talvez esses indicadores precisem ser revistos. Recomendamos que associações avaliem quais indicadores são de fato relevantes e elaborem propostas para o Inep, já que os organizadores do evento indicaram que estão abertos para as sugestões. Esperamos que Inep/Daes, Conaes e Seres trabalhem de forma orgânica para viabilizar a cesta de indicadores, que na sua essência retomará alguns princípios do Sinaes, como a existência de um processo de avaliação que valorize a missão e o projeto institucional, que dê relevância e regionalidade e a pluralidade institucional. Não podemos continuar com um sistema de avaliação em que as diferenças não são valorizadas em nome de uma homogeneização que facilita o controle do sistema.

Nesta perspectiva, o Semesp apresentou no evento a Rede de Autoavaliação, que integra 46 IES de todas as regiões e que reúne faculdades, centros universitários e universidades. A rede nasceu tendo os princípios do Sinaes como alicerce. Valorizamos e reconhecemos o papel estratégico das comissões próprias de avaliação e a autoavaliação como alicerce de todos os processos avaliativos organizados pelo MEC. Na rede respeitamos e contemplamos todos os indicadores do MEC, mas vamos além, ao propor indicadores de egresso, de impacto social, de sustentabilidade ambiental (ODS e ESG), entre outros. Na rede esperamos criar um efeito multiplicador, em que cada vez mais IES privadas e públicas estejam empoderadas e institucionalizem a cultura da autoavaliação. Há uma clara intenção do Inep de valorizar a autoavaliação nos novos instrumentos.

O Inep demonstra vontade de dialogar e de realizar boas mudanças relevantes ao ter o suporte de universidades e especialistas em avaliação. Por exemplo, a Universidade de Santa Maria, no Rio Grande do Sul, tem desenvolvido um projeto de cesta de indicadores.

A USP, Unicamp, a UFRJ, entre outras universidades também são parceiras do Inep nas discussões e estudos sobre mudanças do processo de avaliação. O Inep formou comissões para propor instrumentos de avaliação para macro áreas, como engenharia, formação de professores e saúde, por exemplo. Buscar solidez nas propostas de mudanças tendo o suporte de instituições relevantes é um caminho possível. Nesta perspectiva, o Semesp, ao liderar um processo relevante, que tem gerado impacto nas IES, se coloca à disposição para colaborar com o Inep.

Os temas de maior incidência no evento foram o da formação de professores da educação básica e do EAD. De fato, o Inep está se movimentando para repensar estas áreas. No que tange aos cursos para professores há intenções de avaliar os estágios, de formar os professores a partir de uma série de competências, de implementar maior presencialidade e de supervisionar de forma efetiva estes cursos. No que se refere ao EAD, o evento apontou para um processo de avaliação que restringe a oferta, implementa novos indicadores (relação professor-aluno, evasão, egressos) e aumenta a supervisão.

Novos indicadores de avaliação para o EAD, novas formas de supervisão, valorização de novos modelos acadêmicos consistentes para o EAD são bem-vindos, todavia, é preciso reconhecer o papel relevante da EAD para o país. Por outro lado, o caminho para o Brasil é extinguir a diferença entre as modalidades presencial e EAD. Definitivamente, o nosso sistema de ensino superior não pode ser dividido em modalidades, pois nossas IES praticam ensino superior cada vez mais baseado nos princípios dos recursos digitais e do hibridismo. O digital e o híbrido cabem em ambas as modalidades.

Na celebração dos 20 anos do Sinaes tínhamos a expectativa de apresentação dos instrumentos de avaliação e de novos indicadores, da explicação de como funcionará a cesta de indicadores, entre outras. Os gestores das IES que querem induzir processos de melhorias institucionais sabem que é preciso rever os processos e instrumentos de avaliação. Estamos ansiosos para que as mudanças aconteçam, em benefício de todas instituições que prezam pelos valores de um ensino superior que atenda de fato às expectativas e demandas da sociedade.

Ao final do evento, o Inep propôs um diálogo com as associações representativas – um fato incomum que precisa ser elogiado. Dar voz às associações é dar voz para aqueles que são responsáveis pelo funcionamento e dinâmica do sistema educacional.

Esperamos que as atualizações do Sinaes aconteçam, que os indicadores atuais sejam revistos e tenhamos a implementação de novos indicadores. O Sinaes foi uma ótima novidade em 2004. Que em 2024 ou 2025 tenhamos novidades equilibradas, que valorizem e reconheçam as boas iniciativas acadêmicas e administrativas. Um bom sistema de avaliação é capaz de supervisionar, de institucionalizar diretrizes que correspondam a seu tempo e que permitam inovações acadêmicas advindas das teorias de aprendizagem e do mundo digital.

*Fábio Reis é diretor de inovação e redes do Semesp, presidente do Consórcio Sthem Brasil e secretário executivo da MetaRed TIC Brasil. Lincoln Villas Bôas Macena é diretor de registro acadêmico e regulação do UniCV e procurador institucional


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