Expansão sustentável garante menos susto com novas regras

REVISTA ENSINO SUPERIOR • 18 de junho de 2025

Fonte da Notícia: REVISTA ENSINO SUPERIOR
Data da Publicação original: 16/06/2025
Publicado Originalmente em: https://revistaensinosuperior.com.br/2025/06/16/ead-expansao-sustentavel/

O novo marco regulatório do EAD no Brasil, estabelecido pelo Decreto nº 12.456/2025, traz novas regras para a modalidade que detém a hegemonia do mercado do ensino superior privado. Foram criadas para abarcar a utilização das novas tecnologias e garantir que elas possam prover de qualidade os cursos oferecidos à população. O tempo, as adequações promovidas pelas IES, e processos de supervisão e avaliação dirão se esse objetivo foi alcançado.

Para Antonio Esteca, CEO no grupo que reúne a Faculdade Metropolitana do Estado de São Paulo (Fameesp), em Ribeirão Preto, e a Faculdade Metropolitana de Franca (Famef), há pontos positivos na nova regulamentação, entre eles, o de pacificar conceitos, como, por exemplo, o de presencialidade. Também avaliador do Inep, Esteca conhece a confusão que se estabelece sem as definições precisas. “A IES fala que tem aula presencial e, quando o avaliador chega, vê que é ao vivo, mas remoto. Presencial é professor e alunos no mesmo tempo e espaço.”

Outro ponto forte do novo marco regulatório, de acordo com o CEO, é a definição dos papeis dos atores do processo. “O mediador hoje faz o apoio pedagógico, é um professor. O tutor mudou de perfil, ele é uma pessoa administrativa, pode ser qualquer pessoa graduada que dá um apoio: como entra na plataforma? Como paga boleto? É uma pessoa do técnico-administrativo.”

A exigência da prova presencial é positiva, principalmente porque “conduz os alunos aos polos. Nós já temos isso na Metropolitana. Os alunos adoram ir ao polo, eles sentem pertencimento, encontram amigos, fazem network.” A exigência de polos de apoio presencial mais bem estruturados também é importante. “Não dá para ser PDV – Ponto de Venda”.

Outro aspecto bem-vindo é a unificação de atos regulatórios, que “melhora a eficiência do processo”. “Antes, havia credenciamento EAD e credenciamento presencial. Recredenciamento EAD e recredenciamento presencial, além de credenciamento de Centro Universitário. Não tem mais isso. Hoje, no ato de credenciamento, a IES indica quais modalidades de ensino está se propondo a oferecer.”

De um modo geral, acredita o gestor, saem prejudicadas as IES que estão tentando entrar no mercado EAD. “É um ponto positivo para quem já está, porque segura a entrada de novos players no mercado”. Mas não deixa de ser problemático, até crítico. “Quem já tinha feito o pedido de credenciamento mas não tinha passado por visita, o processo será extinto. Vai ser um Ctrl Z para todo mundo que estava querendo entrar.”

Impacto sem traumas

Em 2014, Esteca chegou à Escola Metropolitana de Ribeirão Preto, que até então atuava na educação básica e, em Pirassununga, cidade próxima a Ribeirão, tinha uma única faculdade, atualmente com quatro cursos presenciais e aguardando autorização para o EAD.

Formado em ciência da computação, com mestrado em gerenciamento de pessoas no desenvolvimento de software, o atual CEO chegou ao grupo para coordenar um curso de ciência da computação. Acabou por capitanear a virada de chave.

Ele conta que seu trabalho foi aliar tecnologia à experiência em educação já existente na instituição. A entrada no mercado do EAD, hoje o principal negócio do grupo, se deu com a criação de um e-commerce de cursos de curta duração, 100% EAD, de extensão e aperfeiçoamento. Atualmente são 1.400 cursos livres, “e ainda tem muita tração”, afirma. A empreitada ofereceu experiência para a atuação num mercado super competitivo. No lastro do que deu certo, a Fameesp e a Famef começaram a operar em 2016 e hoje têm cerca de 200 mil alunos, 10 mil deles na graduação, os demais na pós-graduação e nos cursos livres.

A opção por uma “expansão sustentável” faz com que o impacto das novas regras seja assimilado sem traumas. O que Esteca chama de “sustentável” é o oferecimento de qualidade. “O projeto pedagógico é onde está nossa força”, afirma. “Nos últimos três anos, passamos por umas 110 avaliações in loco, todos sempre elogiam nosso modelo pedagógico.”

Além disso, destaca o CEO, no quesito qualidade faz diferença a produção de conteúdo próprio. “Inicialmente usamos material comprado, hoje temos uma ‘fábrica’ de conteúdo muito grande, ela só produz para nossas instituições, não vendemos para outras.” O corpo docente é majoritariamente formado por mestres e doutores, ressalta.

“Sou ponderado, nunca achei legal ter enfermagem no EAD, por exemplo. Podia ter pedido credenciamento, mas eu achava perigoso. Os cursos que eu tenho foram pouco afetados. Entre eles, os mais afetados foram as licenciaturas.”

Os preços são baixos. Os cursos de graduação têm mensalidades a partir de R$ 90,00, no primeiro semestre, e R$ 149,00 no restante do curso. Engenharia, um pouco mais, R$149,00 no primeiro semestre, R$ 199,00 no restante do curso. “Consigo fazer o preço barato com base numa engenharia tecnológica. O segredo para isso é não ter a AVA terceirizada. Não uso plataforma Moodle, nem Blackboard, temos plataforma que eu desenvolvi, o que permite ajustes, por exemplo, sem altos custos.”

É voz corrente que as novas regras farão os preços dos cursos EAD subirem. Se os grandes grupos, as empresas de capital aberto, se adequarem conforme a legislação, terão de majorar seus preços, acredita Esteca. Entretanto, ele não vê necessidade de reprecificar todos os cursos da sua instituição.

“O meu custo é baixo? É. Por exemplo, a Netflix é melhor do que a locadora? Muito melhor e muito mais barata. O governo tinha que gerar uma chavinha para entender que não é o preço que indica qualidade, é o modelo pedagógico e tecnológico. Quando falamos de um processo disruptivo, temos de pensar na desmonetização, um dos seis ‘Ds’ de Peter Diamandis, que fala sobre inovação disruptiva e crescimento exponencial.”

“Ainda que haja aumento significativo dos valores das mensalidades, “as pessoas vão continuar estudando. O EAD não veio porque é mais fácil e mais barato, é porque as pessoas não querem o presencial. Fazemos testes aqui. Temos cursos de administração presencial e EAD, o preço é o mesmo e tem mais matrícula no EAD. É por causa da comodidade”, afirma.

Polos não compartilhados

O Art. 29, inciso 5 do Decreto 12.456/2025 – “É vedado o compartilhamento de Polo EaD com outra Instituição de Educação Superior” – inviabiliza as parcerias, hoje bastante comuns, nos polos. Embora concorde que devam ser mais bem estruturados – com espaço físico adequado e acessível, laboratórios específicos, biblioteca com acervo físico e/ou digital, conectividade de internet de qualidade, equipe técnica e de apoio presencial, conforme o decreto –, Esteca discorda quanto à impossibilidade de compartilhamento, ao menos, como no caso dele, de instituições da mesma mantenedora.

“É um problema que apareceu. Temos 14 polos próprios, a mantenedora das duas instituições [Fameesp e a Famef ] aluga, contrata funcionário e investe em estrutura. Já temos a infraestrutura requerida no novo marco regulatório. Agora, fazer uma separação de prédio é até simples. Vamos adequar.”

O CEO ressalta, entretanto, que o compartilhamento de espaço é uma tendência contemporânea, no mundo e em muitos setores. Espaços de coworking, grandes áreas em fazendas com placas solares que recebem investimentos de várias empresas são exemplos. “Estamos falando de uma economia sustentável. Permitir a várias instituições usar o mesmo endereço, com os devidos quantitativos bem controlados, ou se pelo menos tivesse alguns critérios para compartilhar, mas pudesse, conseguiríamos ter polos melhores, com mais investimentos.”

Outra desvantagem trazida pelas novas regras são, de acordo com Esteca, as cargas horárias presenciais muito altas para alguns cursos. A engenharia é um deles. “As engenharias terão 60% de presencial e síncrono mediado. Isso significa que o aluno que quiser fazer engenharia, além de ter de ir muitas vezes ao polo, quase todo dia, vai ter de fazer ao vivo no horário que a instituição definir.”

Assim, pondera Esteca, serão excluídas, por exemplo, as mães solteiras e os que trabalham no turno 12×36, além daqueles que vivem distantes dos polos. “Se levar em conta todas essas pessoas, estamos falando de milhões. Deveriam ter dosado melhor”, finaliza.


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