Gastos e eficiência no ensino superior

O GLOBO • 12 de agosto de 2019

A UFRJ, maior universidade federal do país, iniciou a semana passada sem saber se teria condições de pagar até o fim do mês despesas básicas de serviços como luz, água, gás, limpeza e vigilância. A reitora Denise Pires de Carvalho alertou que, a continuar assim, não haveria como garantir o pleno funcionamento da instituição. Foi mais um capítulo na agonia que vivem instituições federais de ensino superior desde que o MEC começou a repassar menos verbas destinadas a manutenção.

Este movimento começou em 2014 e chegou ao seu ponto mais crítico neste ano, quando o ministro Abraham Weintraub – de início justificando a medida como punição à “balbúrdia” e depois alegando razões técnicas – anunciou o contingenciamento dessas verbas. Paralelo a isso, o governo apresentou uma proposta para as universidades federais, o “Future-se”. O programa sinaliza para a facilitação de captação de recursos no setor privado e fala em aumento da eficiência. O Conselho Universitário da UFRJ, porém, já rejeitou a proposta, alegando, entre outros pontos, que ele não “aborda os problemas centrais de financiamento do ensino superior em um contexto de profundo desgaste para as Instituições Federais submetidas à profunda instabilidade orçamentária”.

A disputa entre enfatizar mais a necessidade de aumentar os recursos ou a melhoria da eficiência do gasto público sempre esteve presente nos debates sobre o futuro das universidades federais. Em 2007, no segundo mandato do presidente Lula, o MEC tentou conciliar essas duas dimensões com o programa ReUni, que previa liberação de verbas para expansão de matrículas, com contrapartidas de aumento da eficiência. O programa surgiu num contexto bastante distinto do atual: estávamos num cenário econômico favorável, sob um governo disposto a aumentar o gasto público.

Olhando a expansão das matrículas, o ReUni foi um sucesso. A rede federal de ensino superior dobrou de 2007 para 2017, passando de 616 mil graduandos para 1,3 milhão. Junto com políticas específicas, como as cotas, esse movimento foi fundamental para aumentar o percentual de alunos de famílias de menor renda nas universidades públicas.

A parte que não funcionou a contento no ReUni foi a da eficiência. O programa previa a diminuição da evasão, a ampliação de cursos noturnos e o aumento na relação de alunos por professor. No caso dos cursos noturnos, houve aumento em números absolutos, mas a proporção das matrículas à noite no total das federais variou muito pouco, de 26% para 30%. Esse percentual é de 41% nas estaduais e de 69% nas particulares. O número de alunos por professor ficou também praticamente inalterado, em parte por causa de uma mudança na forma de cálculo desse indicador, feita depois do anúncio da meta.

E a evasão, provavelmente o maior foco de ineficiência no gasto público universitário, segue alta. Nas federais, cinco anos depois do ingresso, 43% dos alunos abandonam o curso em que se matricularam. Cabe a ressalva de que este é um problema grave também no ensino superior privado, com taxas de desistência em cinco anos que chegam a 53%.

O debate sobre como melhorar a eficiência do gasto público é sempre necessário. Mas não será asfixiando as universidades federais pelo contingenciamento de recursos para despesas básicas como luz, água e segurança que vamos atingir esse objetivo.

Notícia publicada no site O GLOBO, em 12/08/2019, no endereço eletrônico: https://blogs.oglobo.globo.com/antonio-gois/post/gastos-e-eficiencia-no-ensino-superior.html


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